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Foto: Mariana de Carvalho. Oxford, Abril 2010

Oscar Wilde

Oscar Wilde de Hoje (e Sempre)

"a man who moralizes is usually a hypocrite, and a woman who moralizes is invariably plain"

domingo, 24 de outubro de 2010

Sonhar, Viver, Sentir

Para o hinduísmo, o estado mais verdadeiro que vivemos é o sonho, pois é ele que nos liga ao mundo transcendental e que nos comunica com o infinito, saindo da materialidade mesquinha do dia-a-dia. O que nós chamamos de realidade, a vigília, para eles representa Maya, a ilusão.

Não cheguei a tanto, mas nos últimos tempos tenho valorizado bastante o Sonho. Não é apenas a evidente constatação de que o sonho influencia a vigília e vice-versa. Como quando o sonho lembrado define o estado de espírito de seu dia. Ou quando você vai dormir com um problema e sonha com ele. É a realização de que ambos são estados da mente igualmente autênticos e verdadeiros.

Para princípio de conversa, é muito simplório considerar a realidade desperta como a única válida somente porque podemos tocá-la: isto é coisa de gente materialista sem imaginação. Uma vez eu estava sonhando que voava sobre Florença, em um entardecer deslumbrante cheio de silêncio e cores. Percebi que sonhava e diante de tanta beleza e da sensação de liberdade infinita, pensei dentro do sonho: “se voar assim em sonho é tão bom, vou acordar para usufruir desta sensação na realidade, que é muito melhor”. Abri os olhos, percebi o teto e me disse: “seu e-s-t-ú-p-i-d-o, idiota: imbecil!”.

Ultimamente tenho aprendido muito com meus sonhos. Óbvio que não sou nenhum Kekulé, o químico que descobriu o formato do benzeno quando sonhou uma cobra que mordia o próprio rabo. O que eles têm me contribuído é de ordem emocional. Tive uns diálogos absolutamente plausíveis, que de tão concretos hoje os considero parte da minha experiência vivida, até porque não tinham nada de onírico ou fantástico. Neles eu conseguia interferir no desenrolar do sonho, escolhendo e pensando o que dizer, como se eu estivesse tendo conversas banais. Só que não eram banais: eram conversas que nunca tive com pessoas com as quais nunca mais falarei. Disse o que queria, fiz o que era preciso, e vi atitudes que sempre intuí que existiam, mas nunca havia presenciado. Alma apaziguada. Ponto final.

Agora, depois destas experiências, vejo que o sonho é de uma concretude emocional tão grande que posso assimilar este estado como tão objetivo quanto estar acordado. E isto serve também para sonhos mais descabelados e fabulosos, porque o que interessa não é o contexto ou a lógica (se bem que às vezes a falta de lógica é o melhor deles...). Meus sonhos são reais, pois eu os sinto. Logo, existem. E verdadeiramente eu compreendo que vivi aquilo, incorporando as emoções sentidas e fazendo-as parte da minha experiência de vida.

Eu acho sem graça buscar explicações para os sonhos. É empreitada demasiado racional, que esteriliza o potencial de enriquecer nossa vida com imagens ricas demais, complexas demais, metafóricas demais. Melhor sentir os sonhos que interpretá-los; deixo esta tarefa para os psicanalistas. Prefiro sê-los.

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